quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

Votação do aumento do próprio salário e falta de sensibilidade dos vereadores dá margem a desinformação, demagogia e populismo

O tsunami midiático contra a Câmara Municipal de São Paulo é consequência direta (e previsível) da ação (ou omissão) dos vereadores ao aumentarem o próprio salário.

Pior, depois de terem retirado o assunto da pauta, informado erroneamente a imprensa e a opinião pública que o assunto não voltaria a ser discutido e, no meio da última sessão do ano, como parecia óbvio só para quem conhece os meandros do Legislativo, reinserir o projeto da Mesa Diretora na ordem do dia e aprová-lo a toque de caixa.

Então, vamos falar outra vez sobre a tal "votação do próprio aumento" do salário dos vereadores, que vem sendo tratado como imoralidade e ilegalidade. A Ordem dos Advogados do Brasil, por exemplo, que há tempos perdeu o protagonismo e bate cabeça para reaparecer na mídia com algum destaque positivo, produz esse tipo de notícia: OAB diz lamentar aumento salarial de vereadores em SP e estuda ir à Justiça.

Diz o seu presidente, Marcos da Costa: "A OAB São Paulo, cumprindo seu papel de defesa dos princípios republicanos insculpidos na Constituição do Brasil está analisando o aumento para, entendendo desprovido de base constitucional ou legal, propor as medidas cabíveis em proteção ao erário público e a sociedade paulistana."

Descontados os atentados à língua pátria num comunicado que deveria ser claro e objetivo, a OAB peca duplamente por sugerir que o reajuste de 26% seja "desprovido de base constitucional ou legal". Não é! Aí que está o grande equívoco: pode-se questionar moralmente a questão, mas não a sua legalidade e constitucionalidade.

Faltou sensibilidade e competência dos vereadores ao votar o reajuste sem saber explicar as razões à população, num momento de crise, de desemprego e de corte de gastos. Mas repor a inflação dos últimos quatro anos, sendo que um próximo reajuste só poderá ser apreciado também daqui a quatro anos, não tem nada de inconstitucional. Ao contrário.

Mas "eles votaram o próprio aumento", reclamam cidadãos, jornalistas e advogados desinformados. Na verdade, seguiram à risca o que determina a legislação: aprovaram o reajuste ao fim de uma legislatura, valendo para a próxima. Se 33 dos 55 vereadores vão se beneficiar desse reajuste por terem sido reeleitos, é uma outra história.

Outra solução seria aprovar um gatilho automático, equiparando o salário ao teto permitido (75% do deputado estadual, que por sua vez é 75% do salário do deputado federal). Ou seja, a cada aumento salarial votado em Brasília, o aumento no município seria concedido em cascata. Não resolveria nada em termos práticos e ainda diminuiria a transparência do ato.

Também merece outra discussão se, na opinião média do paulistano, os vereadores ganham demais e produzam de menos (embora um salário líquido de R$ 11 mil reais não seja nada abusivo, ainda mais quando é menor que o salário dos próprios chefes de gabinete da Câmara e outros assessores, além de vereadores de capitais e cidades de médio e grande porte, subprefeitos e secretários da Prefeitura de São Paulo etc.).

Em resumo, os vereadores vivem nesta bolha impenetrável, nesse mundo à parte, tão dissociados da realidade e dos anseios da população que até quando cumprem rigorosamente as determinações legais (em benefício próprio, dirão alguns, com razão) são questionados por todos e acabam desmoralizados.

Não é por acaso que, ano após ano, a Câmara é a instituição que apresenta o menor índice de credibilidade nas pesquisas de opinião. Vai continuar assim até que vereadores e partidos entendam que é preciso mudar radicalmente a forma de agir e de se relacionar com a cidade e a cidadania. O Brasil está mudando, de fato. Só os políticos não perceberam.

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